domingo, 4 de maio de 2008

John Cage dizia que a música estava para além da música e, assim, chegávamos num tempo onde o ruído poderia enfim ser compreendido como música. João Gilberto fez a dissonância soar delicada, apontando novos caminhos. Glenn Branca mudou a paisagem, compondo suas sinfonias para guitarras elétricas. Nelson Cavaquinho e Kurt Cobain usaram a música popular para expressar a tristeza, colocando-a num lugar de profunda beleza. Ikue Mori elevou o computador e a bateria eletrônica a um lugar onde jamais pensaríamos. Arto Lindsay uniu o ruído no wave à dissonância do João Gilberto (ou teria sido o contrário?). Yoko Ono transgrediu o rock´n´roll fazendo-o dialogar com a música de vanguarda - que por sua vez, em suas mãos, olhava para a antiga música vocal japonesa. Sonic Youth aprendeu que o ruído extremo e a delicadeza podem dialogar dentro da música, de uma mesma música. E nos ensina. Também nos ensina o mar e seus sons-movimentos. As ondas, que sobem e descem. Mirella Hipster tem um som que pode ir de um grande ruído ao quasi-silêncio. E o tempo pode se fazer elástico. As músicas podem durar por muito, como podem não. Defuntos podem surgir para lhes emprestar suas vozes (deus salve os samplers!), mas também podem se apresentar sem nenhuma voz. Como Mirella Hipster é uma banda sobretudo de improviso, o que ela tem a apresentar em seus shows é sobretudo uma surpresa, mesmo quando tocam seus temas, criados antes daquele instante do show. Ruído e improviso. Delicadeza e velocidade. Potência e fragilidade. Sensorialidade. Emoção deslavada e sutil. O mundo é grande demais. E as sensações são muitas, ai...

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